sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

Monólogo de Natal (Aldemar Paiva)

Não gosto de você Papai-Noel...
Também não gosto desse seu papel
De vender ilusões à burguesia.
Se os garotos humildes da cidade
Soubessem de seu ódio à humildade,
Jogavam pedras nessa fantasia!

Você, talvez, nem se recorde mais,
Cresci depressa e me tornei rapaz
Sem esquecer, no entanto, o que passou...
Fiz-lhe um bilhete pedindo um presente
E a noite inteira eu esperei contente,
Chegou o sol e você não chegou!

Dias depois, meu pobre pai, cansado,
Trouxe um trenzinho feio, enferrujado,
Que me entregou com certa hesitação.
Fechou os olhos e balbuciou:
- É prá você... Papai Noel mandou -
E se esquivou contendo a emoção!

Alegre e inocente, nesse caso
Pensei que o meu bilhete com atraso
Chegara às suas mãos no fim do mês.
Limpei o trem, dei corda, ele partiu,
Deu muitas voltas e meu pai sorriu
E me abraçou pela última vez!

O restou só eu pude compreender
Quando cresci e comecei a ver
Todas as coisas com realidade.
Meu pai chegou um dia e disse a medo:
- Onde é que está aquele seu brinquedo?
Eu vou trocar por outro na cidade –

Dei-lhe o trenzinho, quase a soluçar
E como quem não quer abandonar
Um mimo que lhe deu quem lhe quer bem
Disse medroso: - Eu só queria ele...
Não quero outro brinquedo...quero aquele...
E por favor não vá levar meu trem –

Meu pai calou-se e pelo rosto veio
Descendo um pranto que eu ainda creio,
Tão puro e santo, só Jesus chorou.
Bateu a porta com muito ruído,
Mamãe gritou, ele não ouvidos,
Saiu correndo e nunca mais voltou!

Você, Papai Noel me transformou
Num homem que a infância arruinou,
Sem pai e sem brinquedos. Afinal,
Dos seus presentes, não há um que sobre
Para a riqueza do menino pobre
Que sonha o ano inteiro com o Natal!!

Meu pobre pai, doente, mal vestido,
Prá não me ver assim desiludido
Comprou por qualquer preço uma ilusão...
Num gesto nobre, humano, decisivo,
Foi longe prá trazer-me um lenitivo,
Roubando o trem do filho do patrão!

Pensei que viajara, no entanto,
Depois de grande, minha mãe em pranto
Contou que fora preso. E como réu,
Ninguém a absolvê-lo se atrevia.
Foi definhando até que Deus um dia
Entrou na cela e o libertou pro Céu!

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Conheci este texto num momento mágico, quando o querido Professor Julião Marques o declamou perante minha saudosa turma do 2º ano de História-UFAL, lá nos idos de 2004. Isso mudou toda a minha concepção de Natal, desde então para mim uma coisa feia e repleta de hipocrisia. Não sou comunista/marxista, mas isso é uma invenção burguesa de mal gosto.

O título do poema é meio duvidoso, pois encontrei-o com outros, sempre dando os créditos ao Aldemar Paiva. Estou confiante nas palavras desse cara legal aqui: http://www.bodega.blog.br/nareal/monologo-de-natal/; inclusive postei um comentário perguntando-lhe sobre essa questão, está tudo lá.

Enfim, desejo dias bons a todos. Afinal, é disso que precisamos...

quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

Sapatada no Bush


Esse na charge do Carlos Latuff é Mutanzer al-Zaidi, repórter iraquiano que por pouco não acertou uma sapatada no Bush.

Agora é a nossa vez de jogar o sapato no Bush!

Link:
http://bushbash.flashgressive.de/

domingo, 14 de dezembro de 2008

RessaCapitu

Em cinco capítulos, com muito psicodelismo, grandes interpretações, trilha sonora impecável e fidelidade ao texto original com nuances pop, a minissérie Capitu se fez. De longe a melhor adaptação de uma obra literária que EU já vi. A cada capítulo o sentimento de “algo poético no ar” se confirmava. Uma delícia! Dom Casmurro, considerada a obra maior de nossa literatura brasileira (EU discordo), se transformou maior aos meus olhos, deu vontade de reler o Machado de Assis.

O diretor Luiz Fernando Carvalho novamente nos fez imaginar além do que se vê no vídeo (lembra A Pedra do Reino?), principalmente em relação aos famosos “olhos de ressaca” de Capitu. Depois de conhecer a beleza de Letícia Persiles essa metáfora ganhou mais consistência em mim, e de quebra ela ganhou mais um admirador da sua banda Manacá, que conheci mediante as notícias na mídia a respeito da minissérie.

Porém, o que seria desse projeto sem a interpretação e narração do ator, apresentador e poeta Michel Melamed? Nunca imaginei que ele fosse tanta coisa ao ver seu programa na TV Cultura (por sinal, ótimo, pena que esqueci o nome). Destaco o olhar impassível nas cenas finais, quando o Bento Santiago reencontra Ezequiel, seu filho (?).

Outro ponto alto foi o clima de dúvida e insinuações que pairaram sobre o triângulo Bento-Capitu-Escobar. Quem já leu o livro sabe do ciúme de Bentinho por Capitu, da desconfiança sobre a relação desta com Escobar, que aparece várias vezes na sua casa quando o marido está fora. Ao leitor diletante, mais desinteressado, talvez passe despercebido o amor platônico de Bento e Escobar. As declarações do narrador são tão carregadas que se poderia trocar o nome deste pelo daquela. EU, que li o romance mais por deleite que outra coisa, só percebi isso quando li um célebre ensaio do Millôr Fernandes (como gostaria de reler agora!). Isso, claro, ganhou proporções enormes na minissérie. Estou convencido de algumas coisas: Bentinho foi traído e depois de tantas tentativas fracassadas de engravidar Capitu, concluo que era estéril (a obra não diz isso, mas eu não tô fazendo crítica literária mesmo!) sendo Ezequiel filho de Escobar. O Millôr vai mais longe e diz que Bento e Escobar tinham uma relação homossexual. Embora soe machista, é minha sincera opinião.

Enfim, uma obra grandiosa com uma adaptação primorosa. Quem não leu o livro que o faça logo. Quem não viu a minissérie, paciência, daqui a uns meses a Globo lança em DVD.

Estou meio embriagado até agora. Tô com uma ressaCapitu da gota!

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Atualização importante: Tanto tempo depois, eis que encontro as palavras do Millôr (R.I.P.) sobre Dom Casmurro, aqui.

segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

Reflexão sobre o filme “Mar adentro”

Afinal, o que é a vida? Ou, a quem ela pertence? Longe do intangível, não sei, perto dele me sinto escravo do tempo. Seria a vida apenas um instante no grande relógio do cosmos, como parece ser? De qualquer forma, o consenso é ilusório para estas perguntas redundantes (ecos), ao menos pode-se afirmar que há quem deseje viver, não tendo muitas razões para isso, entretanto suficientes a si, e para não alongar muito, há quem deseje morrer pelo mesmo. Para a maioria das pessoas, a morte é o maior vilão da estória da humanidade, mas também serve de consolo e fim a dor de, por exemplo, estar privado das sensações.


Vida: não é uma coisa, não é qualquer coisa. É algo indefinível. Há uma vida para cada ser que vive, um conceito diverso e único para cada humano. Como dizer o que é sem equipará-la aos objetos? Ela está aí, em todos os lugares desse mundo.


Agrada-me escutar o ar entrando e saindo dos pulmões quando respiro mais forte, sinto-me em paz no silêncio total quando nada escuto nem penso, de preferência vendo o céu azul à tarde, as nuvens, o verde. Vivo. Sou tão mais vivo quando as pessoas que amo me sorriem. Se eu perder estas coisas, perderei meu conceito de vida.


Para quem não sabe, nem deseja saber, mas entende que há razões para viver, provérbio nenhum se encaixa melhor aqui que o “Carpe diem”.


Bem ou mal, estou vivendo.

terça-feira, 2 de dezembro de 2008

Nossa história


Ninguém foge à história. Somos parte dela, produzimo-la constantemente e somos por ela produzidos. Nosso anonimato junta-se ao anonimato de outros e assim compomos as massas que fazem o motor funcionar, silenciosamente.

Pensar sobre nós mesmos é uma atitude filosófica que envolve o esquadrinhamento de nossas raízes. Quem éramos antes de existirmos é o que nos faz, de algum modo, ser o que somos hoje.

O mais fascinante na história é que não há meio de conduzi-la. Por mais que se tente, ela sempre nos surpreende.

Muitas vezes intentamos mudar o mundo, e mudamos, mas não o fizemos como realmente queríamos. Por conta disso, o ar que respiramos está impregnado de odores seculares da labuta de pessoas que construíram os alicerces nos quais erguemos nossas histórias...

Mas há sangue por toda a parte e exploração... e miséria, e desgovernos, e pranto...

Precisamos mudar novamente... ou acabar de vez com a história.