quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

100 anos com Gonzaga


O sertão é nosso lar, repetimos sempre meu bravo amigo Fernando e eu. Lá temos raízes profundas: ele, sertanejo puro, matuto da roça que lutou até alcançar seu sonho de conduzir suas ovelhas; eu, filho de sertaneja e apaixonado pela terra de onde brotou meus ancestrais. Cresci ouvindo as histórias do povo da caatinga: de Lampião, Padre Cícero, da gente bonita e acolhedora das serras, das lendas e causos da minha vasta parentela. E a música faz parte disso tudo, tanto como manifestação de alegria quanto de nostalgia e saudosismo, para mim, de coisas que somente imagino.

O retirante, a feira, o homem valente, o amor grande nas simplicidades, a dor, a esperança. É na música de Seu Luiz Gonzaga que revivo essas imagens e quando me sinto um sertanejo. Encontro-me com a outra metade de mim, uma vez que nasci na beira do rio Mundaú. Reconheço a história dos meus avós na cantoria do Velho Lua, entro em sintonia com meus amigos de Água Branca e Mata Grande, alturas das Alagoas, vivo na catarse o que eles vivem na pele de sol a sol. Fico pasmo por detectar ainda o boiadeiro em seu caminho regular cuidador da riqueza pouca que tem ou muita dos coronéis. Fico doce comendo rapadura, mastigo devagar o queijo bom. E não deixo de me indignar que haja ainda tanta fome, tanta miséria, que o quadro continue o mesmo apesar das mudanças ocorridas nos últimos anos em que um nordestino devolveu a esperança àquele povo.

Luiz Gonzaga com sua voz e fole inconfundíveis me transportam para este paraíso na Terra, meu lugar de aconchego, onde renovo minhas energias para continuar remando.

Falar do grande artista que é Luiz Gonzaga é redundante. Ele já era pop quando isso nem existia. Ponto.

Dentre as histórias que minha mãe me contou há uma especial para esta data dos cem anos do Gozagão. É que minha voinha Valdeci certa feita brigou com Ciço Fumeiro para ir a Paulo Afonso-BA ver o show do sanfoneiro de Exu-PE. Ela queria chegar logo cedo, tipo de manhã para um show marcado para noite. Ela queria ficar bem perto do palco, bem perto do seu artista preferido. Imagine uma beata tietando! Ciço não teve como contradizê-la, a mulher era firme, e foram-se dançar forró.

Hoje, quando volto à mesma casa onde minha mãe, tias e primos cresceram, ainda sinto o cheiro de meus avós. Está lá a paisagem cantada por Luiz. Para onde eu for, basta um acorde de sanfona para me levar ao sertão, ou assobio despretensioso d'algum baião.

Luiz Gonzaga não morreu, se encantou.