segunda-feira, 19 de setembro de 2011

Supernatural-mente humanos

Não importa se é anjo, demônio, dragão, vampiro, um deus da mitologia nórdica ou qualquer outra criatura monstruosa. São sempre representados em figura humana em Supernatural (Sobrenatural, aqui no Brasil). É como se os criadores reiterassem a célebre "O homem é o lobo do homem". Decerto há um dente aqui, um olho amarelo ali, uma sombra acolá, mas tudo é humano, ou humanóide. Supernatural só recorre quando necessário aos efeitos especiais (acho que não se usa mais essa expressão). O conflito é sempre baseado nas pessoas, mesmo que representem na verdade da série seres fictícios. Este é  um dos grandes méritos do seriado, bem como a incansável busca pela felicidade dos Winchester e o maniqueísmo que há entre eles. Além de sacadas extremas como o paraíso ser aquilo que mais se gosta na Terra ou o inferno uma fila, na qual se pega uma senha, espera-se chegar até o início e, uma vez lá, volta-se para o final sucessivamente. Não conheço ninguém que goste de filas.

Na série, sugere-se o abandono de Deus como a causa de tanto caos e desequilíbrio entre os mundos, mas isso ainda não foi totalmente explicado, inclusive há eventos cuja única explicação reside na suposta intervenção divina. Em resumo, Supernatural desdenha dos conceitos de divindade que temos, coloca pobres mortais, Dean e Sam, como protótipos de Ulisses a enfrentar um mar de seres sobrenaturais e assume uma posição antropocêntrica, numa releitura pop do Renascimento.

Na sexta temporada, muitas reviravoltas aconteceram, o que é bem típico da série, e Castiel, após passar a perna em todo mundo, autodenomina-se Deus. Porém, quando ele aparece no vídeo é apenas uma figura humana em todos os sentidos, mesmo que o personagem seja um anjo, em forma e conteúdo. Porque o mal e o bem que conhecemos é humano, demasiadamente humano.

Que venha a sétima temporada de Supernatural. (E a trilha sonora arrasadora, a melhor de todas as séries!)

quinta-feira, 15 de setembro de 2011

Dois filmes

Filmes, uma paixão comparável somente à música e à literatura para mim. Recentemente, vi alguns filmes por indicação da adorável Jaquelyne Diniz (@JaquelyneDiniz), dona do Sinuado Espelho. São eles, na sequência em que foram vistos:

- O fabuloso destino de Amélie Poulain (Le fabuleux destin d'Amélie Poulain, 2001)

Surpreendente. O roteiro é bem construído e amarrado, não peca pela mesmice, embora perto do final deságue em obviedades, quando se consegue deduzir com certeza o que Amélie fará após cada corte e mudança de ambiente/cena. A narração à la Ilha das Flores (como notou alguém num site que não lembro qual) dá agilidade ao longa, e as divagações do narrador é um elemento muito forte e engraçado. Transmite otimismo e um certo refrigério na alma, pois tem uma mensagem do tipo "fazei o bem sem olhar a quem" e de esperança no amor. É uma comédia sem apelação muito inteligente. Destaque para os "estratagemas" de Amélie. Palmas para os franceses!

- Muito além do jardim (Being There, 1979)

Assim como o primeiro, é uma comédia atípica, inusitada e, principalmente, provocante. O alheiamento de Chance a despeito de tudo o que o envolve é tocante. Ele é um jardineiro, apaixonado por TV, que após a morte do patrão é expulso da casa onde vivia e vaga sem rumo pela cidade até ser atropelado pelo carro que conduzia Eve, a esposa de Rand, um grande e influente empresário moribundo, de quem logra celeremente a amizade e confiança, a ponto de acompanhá-lo quando este recebe a visita do presidente dos EUA em sua casa, onde Chance é hospedado para cuidar da perna acidentada. Ao longo das cenas, o protagonista espalha frases de efeito, algumas de puro nonsense, entendidas na maioria das vezes como conselhos sobre a crise econômica ou franqueza diante de temas severos, como a morte. A ingenuidade do jardineiro impede que ele fale de outra coisa além do seu ofício, no que é entendido como se fosse um sábio falando parábolas. O fato é que Chance trata com naturalidade tudo o que causa apreensão às pessoas e se mantém distanciado. É franco num meio onde a falsidade impera, impassível ao assédio, não mente. Mas chora quando Rand morre segurando sua mão, mesmo assim não deixa de notar que isto "acontece com os velhos". Foi o filme que mais me tocou dos dois, porque me fez rir e refletir como se fosse um do Chaplin. Roteiro conciso, leve e sem lacunas, ótima atuação dos atores. E, como se não bastasse, tem um final surrealista e profanador. Enfim, perfeito.

Esses dois filmes estão longe do mero entrentenimento, pois tratam daquilo que nos torna humanos, no bom sentido, com suavidade e bom humor.