quinta-feira, 22 de janeiro de 2009

O humano virou bicho

Passamos despercebidos aos olhos da multidão com nossos trajes semelhantes, com nosso silêncio. Também não notamos nos outros, a não ser que estejamos movidos por uma curiosidade bizarra de descobrir quem são só de olhar. A menina do caixa, mesmo que sorrindo, esquecerá nossos semblantes em pouco tempo, por isso se há algo errado voltemos logo lá. Você lembra a cara do rapaz que nos entregou um folheto? Todos os dias, na rotina diária, trafegamos as mesmas ruas. Ainda assim, deixamos algo. Você se recorda de alguns colegas de classe com os quais pouco ou nenhuma vez conversamos? Eu também não.

Na verdade, é tudo mentira. Há sempre alguém que nos nota do mesmo modo que o notamos. Desacostumamos com o fato de que os outros são como nós. Sim, lembramos, percebemos e ignoramos tudo isso, para mantermos nosso patamar de orgulho e individualismo sempre alto.

Eu sou egoísta, repito neste espaço mais uma vez. No entanto, não o sou somente pela paixão de ser, fui me configurando a esta forma. Pergunto-me quanto de mim sou eu mesmo. No geral, as pessoas são o que as outras são. Bichos paradoxais.

____________________________________________________________________

O bicho

Vi ontem um bicho
Na imundície do pátio
Catando comida entre os detritos.

Quando achava alguma coisa,
Não examinava nem cheirava:
Engolia com voracidade.

O bicho não era um cão,
Não era um gato,
Não era um rato.

O bicho, meu Deus, era um homem.


(Manuel Bandeira)

sexta-feira, 9 de janeiro de 2009

Guerras

Quando os Estados Unidos invadiram o Iraque no começo desta década, eu reescrevia as notícias da guerra em uma agenda. Não demorou muito, desisti. Cansei logo de indignar-me sem ter como fazer algo imediato por aquele povo que sofre até hoje em nome da loucura desse Bush, que termina seu mandato no próximo dia 20 de janeiro.

Estamos assistindo em tempo real uma nova velha guerra entre Israel e Palestina. Não reescrevi nenhuma matéria, apenas resignei-me a indignação. Um combate injusto, do ponto de vista humano e estrutural bélico, pois são, por exemplo, 520 caças israelenses contra nenhum palestino. Mas, claro, minha indignação é pela morte de tantas pessoas de ambos os lados. Como dizem, nenhuma mãe quer ver seu filho morto, ou melhor, destroçado por um míssil e entregue em pedaços, acompanhado das despesas do funeral.

Não muito patriota, estou longe, anos-luz, do ufanismo. Porém, diante desses acontecimentos, no mínimo, sinto-me seguro aqui na Terra do Nunca 2. É válido relembrar a guerra cotidiana, que alguns chegaram a dizer "não-declarada", com que convivem os cidadãos das grandes cidades deste país. Fico mais saudosista dos tempos que não vivi. Meu remédio é escrever. Placebo.

Tomara que um dia os povos do Oriente Médio possam viver muito mais que acordos falsos, a paz verdadeira.