quarta-feira, 8 de abril de 2009

Reconstruir

Reconstruir... é necessário, mas cansa. Estou cansado de ter de reconstruir o mundo, reconstruir a sociedade, reconstruir os fragmentos que formam as coisas, reconstruir o reconstruir. Que dança interminável é essa? O que vejo, se é uma realidade real, se existe, é um processo avançadíssimo de destruição. Escatologia, dir-se-ia.

Um dos meus melhores amigos sofreu um acidente, deslizou nas escadarias e bateu a cabeça. Perdeu 40% da memória, aproximadamente. Das poucas lembranças que ainda tem sobre amigos e demais pessoas de seu entorno, lembrou-se de mim, da minha fisionomia, nome, o que faço. Em geral, são recordações muito recentes das últimas conversas que tivemos por telefone ou MSN. Evaporaram-se os grandes momentos que passamos juntos de alegria e tristeza. Coube a mim e a outros a missão de ajudá-lo a reconstruir sua memória, e, por consequência, sua afetividade. Minha primeira atitude foi montar slides com fotos e textos de alguns momentos inesquecíveis (!).

Surpreendi-me porque não caí aos prantos nem perdi a vontade de fazer as atividades cotidianas. Já chorei muito em conversas telefônicas quando me contara sobre os flagelos sofridos no Rio de Janeiro. Hoje, simplesmente não entendo a ausência das lágrimas. Temo que isso seja um passo à insensibilidade que tanto combato.

Parece que estou vivendo um capítulo de novela daqueles onde o protagonista perde a memória. Jamais imaginei uma situação dessa em minha vida. Na ficção "tudo sempre acaba bem", o herói recupera as perdas e volta para os braços da mocinha, e neste intervalo mata o vilão. Na realidade, essa realidade real, sobra a esperança lonqínqua de que tudo re-torne. Afinal, não está tudo lá ainda na cabeça dele, porém desconectado? (Se você que lê esse texto souber algo de neurologia, explica-me melhor, corrige-me).

Enquanto a natureza não responder, vou tentando como me é possível ajudá-lo. Ponho a massa esperando o tijolo.

Fernando, meu irmão mais velho, nem a sua desmemória me fará desistir de ti. Porque eu te amo.

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WILTON, estamos aguardando-te!

4 comentários:

O LEGIONÁRIO disse...

confesso que eu não conheci Fernando, apenas sei que é uma grande pessoa porque me fora apontado tambem como tal por amigos tal bom e que confio tanto. minervino, não creio na insensibilidade e sim na calma necessária para que se possa ultrapassar as barreiras que teima em nos derrubar. vpcê me prova masi uma vez que é um grande homem. parabens. fico feliz em conhecer alguem como você, eu ouso em dizer que sou seu amigo e agora masi do que nunca.

Walter Jr. disse...

Minervino, como vc citou no texto, todas as lembranças continuam na cabeça de seu irmão. A revista Superinteressante deste mês trata exatamente desse assunto: memoria. A revista nao trata de exemplos de perda de memoria; o foco principal é reaprendermos a tonifica-la e fortalecer os neuronios que ligam as mesmas. o q falta pra seu irmão é estímulo, nao como esses de slides, mas estimulos perifericos. Por exemplo: em vez de mostrar uma foto de um lugar q vcs foram, leve-o ao lugar naturalmente sem avisa-lo da intenção dele relembrar. abraço, espero ter ajudado.

José Minervino Neto disse...

Obrigado pela dica, Walter! Como estou muito longe (geograficamente) do Fernando, vou pedir a alguém mais próximo para fazer isso.

Abraço!

Igoarias disse...

Cara, belas palavras,não conheço ou pelo menos não lembro do Fernando, mas o que posso falar é que tenha força cara, você e ele, as vezes a ciência não explica tudo, quem sabe a amizade de vocês resolve isso tudo? Abraços e boa sorte.